Simulação de Direito Administrativo II
Advogados da empresa pública "Linhas Mais Próxima"
GRUPO QUATRO: MATEUS ARAÚJO, MARTIM FOSTER E GONÇALO GASPAR.
Proposição
Senhores juízes,
Caros colegas presentes,
Estamos aqui para demonstrar como as ações da empresa municipal não só foram justificadas pelo circunstancialismo do caso, como pela própria lei.
Condenar esta empresa pelo que quer que seja, além de ilegal, é injusto.
Condenar-se-ia a administração por buscar o bem estar público. Não só por almejar, mas especialmente pelo facto de que o alcançou.
Condenar-se-ia a Administração, por administrar.
Questões de facto
A empresa municipal nossa cliente é acusada de cometer dois atos ilegais:
- Não ter competência para delegar a gestão do salão.
Sendo a empresa criada pela CM Linha, esta estava encarregue de um salão. A gestão deste salão foi delegada, durante a época de Covid à empresa privada "Revivre Paris".
- Não poder vender o salão (da maneira que o fez).
Terminado o período da pandemia do Covid-19, a empresa municipal vende o salão à empresa "Revivre" por um preço simbólico através de, diz a acusação dos oponentes, uma preterição do normal procedimento, levando a possíveis casos de corrupção e favorecimento.
O meu colega explorará mais as nuances e justificações que levaram a empresa a agir deste modo.
Passemos às questões de direito.
Questões de direito
Relativamente à competência para a venda do salão:
Esta é definida pela CM Linha quando delegou os poderes na mesma.
Quanto à admissibilidade da venda:
O procedimento de venda estava justificado:
- Se nos dirigirmos ao art. 56.º do CPA podemos observar a celeridade: a estrita adesão a estes princípios fez com que a decisão fosse tomada, não só com a celeridade possível, como não descartando importantes recursos públicos que são tão necessários à administração.
A celeridade do procedimento permitiu a sua economicidade e eficiência – neste caso é condição necessária.
Se acusam o nosso cliente, a empresa, de ter tido celeridade em demasia, devemos argumentar que não só de celeridade vive o procedimento administrativo, e a sua não celeridade implicaria o sacrifício de outros dois princípios, com os quais a acusação em nada se preocupou – o economizar do dinheiro público, que neste caso só é possível pelo pagamento da dívida antes desta se agigantar.
- No art. 59.º refere-se especificamente o dever de celeridade.
Impondo um seguimento diligente, e um prazo razoável, estamos a permitir à Administração fazer julgamentos sobre os diferentes resultados dos diferentes caminhos a seguir possíveis, permitidos pela discricionariedade administrativa.
Esta decisão foi tomada com base na discricionariedade. Querer ignorar o julgamento passível de ser feito por órgãos públicos democraticamente eleitos por sufrágio universal, direto e secreto quanto a atuação a tomar, em nome de impedir a corrupção, que neste caso nem provada foi pela acusação, seria uma conclusão extremamente desproporcional.
Procede-se à vinculação de todos os atos, na sua totalidade, e ignora-se a capacidade dúctil da administração face às situações diversas que lhe são apresentadas.
Sacrifica-se a própria razão de existência da Administração Pública.
Porquê só agora?
O ato administrativo de venda do salão, seguindo o procedimento para este imposto legalmente, e uma vez que a acusação não colocou este problema, foi notificação à Associação de Cabeleireiros em respeito pelo disposto no art. 114.º do CPA, visto esta ser um afetado nas condições de exercício no seu interesse em trabalhar.
Ainda assim, a Associação não fez uso à época do seu direito à audiência prévia, protegido pelo art. 121.º do CPA.
Isto não seria um problema de maior, até porque a razão pela qual a acusação decide iniciar o processo de anulação destes atos não releva para a defesa. Mas serve para indicar que a acusação não fez uso dos meios legais que tinha disponíveis à época.
Esta venda ocorreu, tal como a cedência para gestão, no fim da época de Covid, tal como confirmado pelas testemunhas e sabido por todos os presentes. Meritíssimos e presentes, o Estado de Emergência acabou há mais de 3 anos, a 30 de abril de 2021. Jogando no melhor cenário da acusação, mesmo que a venda tivesse sido realizada a 30 de abril de 2023, estes não ganhariam o caso contra a empresa nossa cliente.
A acusação busca a anulação dos analisados atos, uma vez que pedir pela nulidade dos mesmos seria descabido e indefensável, mas se essa for a posição da acusação estaremos contentes em contrapor nas contra-alegações.
E retomando, uma vez que busca a anulação dos atos analisados, ignora o disposto no art. 168.º, n.º 2, que estabelece um regime geral quanto à anulação de atos administrativos geradores de direitos. Este nosso caso é claramente gerador de um direito à propriedade, protegido pelo art. 1305.º do CC, quanto ao salão e quanto ao material vendido. Este nosso cado subsume-se a este artigo, que prevê uma manifestação do princípio da segurança jurídica.
Tal como dito anteriormente, e lembre-se, sem contrariedade da acusação, esta venda foi realizada há mais de dois anos, no fim da pandemia. O prazo conta desde a venda. Este ato gera, na esfera jurídica da empresa "Revivre", e mais especificamente do dono deste, um direito de propriedade sobre o salão e as coisas neste presentes.
Assim sendo, e cumprindo à letra o disposto no art. 168.º, n.º 2, do CPA, por mais razão que pudesse ter, ainda que não tendo no mérito (e no cerne) da questão, não pode ser o ato de venda anulado pela prescrição do prazo para que esta ação seja intentada.
Senhores juízes, sem qualquer interpretação alongada, visto a subsunção neste caso ser clara e evidente, a atuação da empresa municipal não pode ser alvo de anulação, pelo que esta em nada pode ser prejudicada neste caso.
Continuamos a defender que a sua atuação foi totalmente justificada, fá-lo-emos em seguida, mas abstida esta argumentação a empresa municipal já não pode ser demandada à anulação destes atos analisados, visto o prazo ter prescrevido. Este julgamento estar condenado ad inicium à manutenção da situação jurídica como ela se encontra, condenação esta que é feita pela própria lei.
Não podemos julgar, em pleno 2024, ações que foram tomadas no rescaldo da pandemia de há 4 anos. Todo um conjunto de ações administrativas desmoronaria sob uma posição deste tipo. Se a decisão aqui tomada pelos Srs. Juízes for no sentido almejado pela oposição, não há ato administrativo português, tomado no período da Covid 19, que não tenha de ser revisto.
A decisão é entre aceitar a aplicação totalmente razoável do art. 168.º, n.º 2; e, por outro lado, colocar em causa a existência do sistema administrativo português dos últimos 5 anos.
Quanto à matéria da venda do salão e do equipamento:
- A uma primeira vista pouco rigorosa, a venda do espaço, utilizado para o salão e do equipamento nele inserido, por 1000 euros por parte da empresa "Empresa Linha mais Próxima", aparenta ser injustificada, insensata do ponto de vista financeiro e possivelmente até corrupta, nos olhos de uns que insistem ver o pior da natureza humana, em todas as situações que envolvem qualquer tipo de ação Administrativa por parte de uma entidade pública, mesmo sem possuir a informação adequada à formulação de tal juízo.
- Para acalmar as preocupações e no espírito de respeito pelo princípio da administração aberta consagrado no artigo 17º do Código de Procedimento Administrativo e na ideia de transparência que este evoca, queremos esclarecer os motivos e o contexto que justificaram as decisões tomadas pela empresa, e como de facto estas estão de facto em acordo com o princípio da boa-administração, plasmado no artigo 5º do Código de Procedimento Administrativo e na Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia, no artigo 41º, e que exige uma ponderação por critérios de eficiência, economicidade e celeridade por parte da Administração Pública.
- A verba recebida pelo agora salão e pelos equipamentos nele contidos, que não parece ser correspondente com o valor real dos bens, foi na realidade o percurso económico mais acertado e sensato para a empresa, tendo em conta as informações disponíveis no momento da sua realização e as vicissitudes e problemas do foro jurídico que rodeavam a situação.
- A veracidade destas afirmações deve-se ao facto de que, mesmo após a pandemia, os custos de manutenção do espaço e do material, muito dispendiosos à empresa (valor exato a determinar) e à Câmara Municipal de Linha, mantiveram-se, ao mesmo tempo. Devido à reabertura dos estabelecimentos comerciais e da sociedade no geral, a fonte de receitas consistente no período de confinamento rapidamente desapareceu, deixando a empresa numa posição muito enfraquecida.
- Esta posição enfraquecida é justificada pelo desaparecimento do fim de natureza administrativa, neste caso a prossecução do bem estar social e da "alegria de viver" dos habitantes do concelho esmorecida pela situação pandémica e pelas suas consequências, e pelo fim da auto-sustentabilidade e interesse mercantil desta atividade da empresa. Sendo todos estes requisitos da atividade empresarial nos termos do artigo 20º da lei 50/2012, nos seus números 1 e 2.
- Todos estes fatores deixaram a empresa à mercê dos possíveis interessados, na aquisição do salão e do seu recheio, que sabiam da posição fraca da empresa nas negociações realizadas. Uma tentativa inicial de esperar pacientemente por uma oferta digna, rapidamente se provou insustentável do ponto de vista financeiro, tornando-se também claro que a manutenção do salão, agora sem espaço de manobra no mercado devido às circunstâncias muito específicas que levaram à sua criação, se provaria possivelmente ruinosa.
- Tendo tudo isto em conta, a empresa "Linha Mais Próxima", optou pela opção financeiramente mais viável de acordo com os cálculos efetuados e após uma ponderação de critérios de eficiência, economicidade e celeridade, aceitando assim um preço que aparenta ser inferior ao valor dos bens vendidos,acatando algum prejuízo.
- Evidentemente que a empresa tem como um dos seus objetivos principais o equilíbrio financeiro, no entanto, é necessário ter em conta que o principal vetor que rege toda a atuação da Administração Pública independentemente da forma que esta assuma. É o interesse público, consagrado no artigo 266º/1 da Constituição da República Portuguesa como um dos princípios fundamentais ligados à Administração Pública, e no artigo 4º do Código de Procedimento Administrativo. Como tal, quando a empresa está na prossecução desta função estruturante, é-lhe admitido incorrer em algum prejuízo, se motivos de maior relevância o justificarem, como devem ser o do bem-estar e alegria de viver dos habitantes do Concelho de Linha.
- Concluindo, a situação extraordinária da pandemia, que criou novas responsabilidades para a Administração, no âmbito da prossecução do interesse público, tidas em conta pela empresa, amenizam o prejuízo sofrido por esta, e a decisão tomada respeitante à venda do salão era a decisão financeira mais sustentável tendo em conta os cálculos e as especificidades da situação.
Testemunhas: Tomás Caetano, Diogo Ferreira e Pedro Viegas
Acórdão do Coletivo de Juízes
FACULDADE DE DIREITO UNIVERSIDADE DE LISBOA
Simulação de julgamento de Direito Administrativo II
(2023-24)
Regência: Prof. Dr. Vasco Pereira da Silva
Em plena época da COVID-19, a Câmara Municipal de Linha, decidiu instalar um salão de cabeleireiro, num espaço antes utilizado como loja municipal, para o qual adquiriu equipamento especial, vindo de França, dotado de um sistema antivírus, assim como fardas especiais imunizadoras para o pessoal e para os utentes, com o objetivo de aumentar o bem-estar, a autoestima e a "alegria de viver" dos habitantes do Concelho, nos tempos difíceis que então se viviam. Assim, através da empresa municipal "Linha Mais Próxima" a Câmara assegurava, para além da cedência do edifício e da compra do equipamento referido, também o pagamento dos salários de uma equipa de 30 cabeleireiros, da empresa "Revivre Paris Ailleurs", constituída para o efeito. Passada a situação de pandemia, a empresa municipal "Linha Mais Próxima" vendeu a antiga loja, agora Salão de Cabeleireiro "Paris em Linha", e todo o seu equipamento pelo preço simbólico de 1000 euros, sem qualquer procedimento formal de contratação pública, fundamentando com a relevância dos serviços prestados à população da Linha no combate aos efeitos psicológicos nefastos da COVID-19. A Associação dos Cabeleireiros da Linha opõe-se frontalmente a todas as atuações do executivo camarário e da respetiva empresa municipal, contestando tanto a primitiva configuração do salão, alegando que a sua criação era ilegal, pois não se enquadrava nas atribuições e competências do município nem nas da empresa municipal; tal como a venda do "Paris na Linha", que alega configurar a existência de corrupção e favorecimento de uma empresa de cabeleireiro, que tinha nascido sob a égide do município, em face das suas concorrentes. Por seu lado, o Presidente da Câmara e o vereador responsável pela gestão da empresa "Linha mais Próxima", alegam que a respetiva atuação respeitou sempre as atribuições e competências dos municípios, para além de ser plenamente justificada pela situação de pandemia, que obrigou à tomada de medidas extraordinárias para minimizar os respetivos efeitos psicológicos nefastos na população da Linha.
Relatório
O recorrente, Associação de Cabeleireiros, tem como alegações:
Afirma que a Administração tem de se traduzir na pluralidade de interesses públicos, utilizando como reforço à sua argumentação, o artigo 266/1 da CRP. Afirma ainda que o município teve um impacto significativo nas suas contas, retirando desse impacto uns míseros 1000 euros. Por fim alegam ter ocorrido violação dos princípios da legalidade e de interesse público.
Violação de Regras Taxativas: O Município de Linha violou regras taxativas do procedimento administrativo, o mesmo devia ser um Procedimento de Iniciativa Pública Comum Alegam que o Município cedeu espaço público gratuitamente, violando a Lei n.º 31/2014 e ainda a ausência de audiência prévia e fundamentação adequada (artigos 161/2/d) e 152/1/a) do CPA).
Ilegalidade na Transferência de Verbas: afirmam ter havido transferência de verbas para material antivírus e salários de cabeleireiros sem aprovação da Assembleia Municipal, e ainda falta de registro nas atas orçamentais, indicando um ato unilateral e ilegítimo do órgão executivo colegial.
Usurpação de Poder: O órgão executivo praticou atos que excedem suas competências, invadindo atribuições do poder legislativo.
Quanto ao tipo, classificam o ato administrativo como um Ato Constitutivo, isto por produzir efeitos inovadores;
Sobre o conteúdo do ato afirmam ser um conteúdo de Direito Administrativo;
Alegam que o ato em análise carece de vícios, o princípio orçamental vigora na Lei nº75/2013, de 12 de Setembro, onde está consagrado o regime das Autarquias Locais;
Alegam ser usurpação de poderes, pois foi praticado um ato pelo órgão administrativo que se inclui nas atribuições do poder legislativo. A execução da deliberação competia ao órgão executivo colegial, mas não a tomada da decisão em si;
Afirmam que viola a lei, pois não existe lei que autorize a prática do ato descrito.
Alegam a falta de licitude no que toca o levar a cabo uma venda de equipamentos caros por um valor simbólico;
Defendem que a compra de materiais não é lícita pois o capital que permitiu efetuar a compra foi transferido para as contas da empresa ilicitamente , sendo o ato anulável nos termos do disposto no artigo 163º nº1 CPA.
Destaca-se o desvio de poderes por motivos de interesse privado.
O ato constitutivo, refere-se à venda de um imóvel, foi emitido unicamente por um órgão administrativo com natureza de Direito Privado.
Afirmam a violação das competências da empresa e o fim a ser alcançado sobre o interesse público (artigo 4º da Lei das Autarquias Locais - Lei nº 75/2013, de 12 de setembro).
A empresa pública não tem autoridade para alienar o imóvel, que estava apenas cedido (de forma ilegal).
Competência para a alienação cabe à Câmara Municipal - a mesma ratificou ilegalmente a decisão (Lei 75/2013, de 12 de setembro, artigo nº 33/1 alínea g).
O valor da alienação viola o princípio mencionado, devido à crise económica agravada pela pandemia.
Vícios e Regime de Invalidade do ato, de acordo com a associação é a incompetência absoluta, a empresa realizou atos que são de responsabilidade da Câmara Municipal.
Segundo o código dos contratos públicos, a associação defende que as câmaras municipais devem seguir as regras de contratação pública, exigindo um concurso público, através do artigo 20 do CCP.
A Câmara não cumpriu as regras do artigo 20º CCP;
Ajuste direto não se aplicava à situação específica.
Violou-se procedimentos administrativos e princípios constitucionais;
Houve falta de conformidade com o Decreto- Lei nº10-A/2020.
Violação do princípio da imparcialidade por parte do Vereador, pois este princípio é exigido de um indivíduo que exerça um cargo público, em que depositam confiança de zelar pelas instituições democráticas.
A ideia de imparcialidade, não é apenas uma exigência legal e regulamentar, mas sim constitucional, art.266 CRP e art.9º CPA.
Art. 4º da Lei 29/87 de 30 de Junho, estabelece alguns princípios que o Vereador deve cumprir.
O vereador terá onerado arbitrariamente interesses legítimos dos administrados;
Afirmam que a atuação do vereador é duvidosa, como são também duvidosos os negócios celebrados aquando a acumulação destes incompatíveis e os seus efeitos.
Como contra-alegações temos como parte recorrida, temos as empresas REVIVRE, a Linha Mais Próxima e o Município da Linha.
Contra-alegou a requerida REVIVRE
É competência da Administração pública, imposta por normas europeias, a prestação e a garantia de serviços que justifiquem uma regulação pública mais intensa do Estado.
A ação reguladora do Estado consiste numa intervenção no campo económico através da aplicação do art 81/f) da CRP
No presente caso estávamos perante uma ideia de public procurement, que é regulada pelo CCP.
A questão de facto aqui não é a averiguação da constituição da empresa por falta de competência, mas sim hipoteticamente de um cumprimento postulado de eficiência na atuação administrativa, que deve ser seguida pelo interesse público,.
A legal aplicação do artigo 278º CCP, através da autonomia pública contratual, permitindo à administração pública agir em conformidade com os particulares.
Utilizam para refutar ainda o artigo 200 do CPA, que dá legitimidade para efetuar contratos de direito privado na Administração pública. Acrescentam a aplicação do artigo 201/1 CPA que diz que a decisão de adotar um contrato de direito privado na mesma reveste a natureza do ato
As situações a que estão a ser acusados são atuações conforme o domínio privado da administração, inserindo -se assim na progressiva privatização da administração pública, excluindo assim a imputação de culpa uma vez que os mesmos alegam que a aquisição do espaço e o equipamento nada tem haver com a empresa representada.
A alienação do espaço não foi com vista à obtenção de lucro, a afirmam que a cedência do espaço por parte da administração pública é o meio necessário para atingir o fim que é a manutenção e prossecução do serviço prestado.
Que houve uma violação do princípio da Igualdade no que toca à argumentação acerca do concurso público. justificam dizendo que colocar a empresa Revivre a concurso com outras empresas/entidades, seria de certa forma injusto uma vez que nunca seria tido em conta o desempenho prévio da Revivre.
Alegam ter procedido de forma legal à aplicação do artigo 163/5-b) do CPA como cumprimento da ratio das normas de procedimento por uma via alternativa em coligação com o artigo 4/2-d) do CPTA.
A violação do princípio da proporcionalidade, estabelecida no artigo 7º do CPA, e o princípio da Boa-fé, disposto no artigo 10º do CPA, alegando que existe uma tutela previamente estabelecida entre a empresa Revivre e o município.
Afirmam estar perante um regime de Concorrência, sob tutela dos regime aplicável.
Estamos perante uma situação aplicável ao artigo 10º/1 da Lei nº 19/2012, de 8 de maio, não podendo ser portanto uma situação de concorrência ilícita.
Estar perante um estado de necessidade administrativo regulado pelo artigo 3/2 CPA.
O princípio da imparcialidade foi respeitante de acordo com os critérios dispostos no artigo 9º do CPA, utilizando ainda o artigo 69º/1 para sustentar a sua argumentação, assim utilizaram o respetivo artigo para o excluir de forma a concluir que foi respectivo conforme o aplicável no artigo 9º do CPA.
A Empresa Municipal é acusada de não ter competência para delegar a gestão do salão;
A Câmara Municipal delegou poderes a Empresa Municipal para que vendesse o salão;
Contra-alegou o requerido, Município da Linha:
Referência à pandemia como um evento imprevisto. Por isso, exigiu uma maior versatilidade nas regras jurídicas e na vida privada de cada indivíduo.
Foi mencionado o facto de ser necessário responder celeremente a casos urgentes, tomando em consideração que em certos casos a delonga é prejudicial para a "saúde ou segurança pública".
Maior dificuldade em cumprir prazos normais em situações mais específicas;
A existência de circunstâncias específicas que não poderiam ser antecipadas.
Despesas de abertura do cabeleireiro imprevistas;
Justificaram a urgência da abertura do mesmo, com o Decreto-Lei nº10-A/2020, de 13 de março, um regime excecional de contratação pública e autorização de despesas devido à pandemia;
Contratos por ajuste direto, justificados com motivos de urgência;
Produção de efeitos imediatos após adjudicação;
Isenção de fiscalização prévia do Tribunal de Contas.
Não gerava lucro da forma que estava a ser utilizada;
Decidiram usá-la de forma a promover o "bem coletivo e público", afirmando ser esse o objetivo de uma Câmara Municipal.
Foi-lhe feita a acusação de não possuir competências para proceder à criação de um salão de cabeleireiros.
Regime Jurídico das Autarquias Locais: foi mencionado, nos termos da Lei nº75/22013, de 12 de setembro, art.2º, as particularidades das autarquias locais incluem a adoção de medidas de proteção dos interesses comuns da população abrangendo os domínios específicos do artigoº 7, nº2 e artigoº 23, nº2.
Investimento e obras: da mesma Lei, no artigo 3, alínea c), atribuiram competências às autarquias locais em matéria de investimento.
Domínio das atribuições: de acordo com o artigoº 23, nº2, da mesma lei, foi mencionado que "os municípios têm atribuições nas áreas da saúde, ação social e proteção civil (alíneas g, h e j).
Afirmam fazer parte das capacidades da Câmara Municipal auxiliar os indivíduos mais vulneráveis, juntamente com as entidades que têm competência para tal - administração central e instituições particulares de solidariedade social (alíneas g e v), Lei 50/2018 (LAL), de 16 de agosto, no art.º 14, alínea a) - compete aos órgãos municipais a aprovação dos planos municipais de emergência de proteção civil.
A Câmara Municipal emitiu uma ordem escrita para a instalação do salão, à luz do artigoº 150 do CPA.
A ação foi eficaz (155º CPA) com início imediato da construção e publicação adequada (158º CPA)
A Câmara cumpriu todas as exigências legais e formais para a instalação do salão.
Questionam como poderá a Associação acusar a Câmara de negligência quando provam o contrário.
A associação não respeitou o prazo de reclamação (Art.º 168/2 CPA), fazendo com que fosse rejeitado o recurso (Art. º 196/1 al.c) CPA).
O recurso foi apresentado fora do prazo de um ano, após o fim da pandemia, sem alteração de circunstâncias.
A falta de consulta prévia à decisão administrativa, se não dispensada por lei, é uma falha essencial. A consulta foi legalmente dispensada.
A pandemia impôs desafios inéditos à Administração Pública, exigindo ações rápidas e eficazes para proteger a comunidade. Dispensa consulta prévia, afirmam que fazê-lo atrasaria a prestação do serviço urgente.
A dispensa de consulta prévia requer justificativa conforme o artigo 152 do CPA.
Artigo 266º/2 CRP e artigo 6º do CPA, a administração pública tem de seguir o princípio da imparcialidade.
A imparcialidade tem de ser em relação a todos os indivíduos - igualdade no tratamento (artigo 6º do CPA). Luta pelo interesse público (artigo 266º/1 da CRP e artigo 4º do CPA)
Abriram o cabeleireiro na pandemia, por ser uma decisão urgente no que diz respeito ao bem-estar psicológico da população.
Tomou medidas extraordinárias - artigo 59º CPA.
Na pandemia apenas os serviços necessários estavam abertos, justificam que abriram o cabeleireiro como forma de começar a abrir gradualmente outros serviços.
Contra - alegou a requerida, Empresa Linha mais Próxima:
Justificam que o procedimento de venda encontra-se justificado no art.56º do CPA, agiram com celeridade o que permitiu a economicidade e eficiência;
Fazem menção ao art.58º do CPA, em que faz referência ao dever de celeridade.
A venda do espaço , utilizado para o salão e do equipamento foi 1000 euros por parte da empresa Linha mais Próxima, o que eles acham ser injustificada
O Princípio da administração aberta consagrado no art.17º CPA
Princípio da boa administração, consagrado no art.5º CPA e na Carta de Direitos fundamentais da União Europeia no art.41º;
A Lei 50/2012 art.20º nº1 e 2, estabelece alguns requisitos da atividade empresarial.
A empresa Linha Mais Próxima, optou pela opção financeiramente mais viável de acordo com os cálculos efetuados e após uma ponderação de critérios de eficiência e celeridade, o que consequentemente aceitaram um preço que aparenta ser inferior ao valor dos bens vendidos, mas resultando em prejuízo;
A situação da pandemia criou responsabilidades para a Administração, isto no âmbito do interesse público.
Fundamentação
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir
Questões a decidir
Importa verificar, se no presente caso, os atos administrativos cumprem os requisitos de admissibilidade, anulabilidade ou anulação.
Apreciando
Os requisitos da admissibilidade, da anulabilidade e da nulidade relativamente às matérias de violação dos princípios, do prazo, de Estado de necessidade, as competências e, por fim a audiência prévia.
O Colectivo de Juízes, concorda com uma potencial violação dos Princípios Fundamentais do Direito Administrativo, nomeadamente o Princípio da Proporcionalidade (artigo nº7 do CPA). Sendo este o Princípio que introduz o próprio controlo das medidas de mérito, é necessário ter em conta as ideias da necessidade, da adequação e da ausência, que permitem o controlo do poder discricionário, em questões que até então eram consideradas questões de mérito. É preciso que as decisões sejam necessárias, adequadas e não sejam excessivas, portanto o Princípio da Proporcionalidade, é algo absolutamente essencial no quadro do controlo do poder discricionário, que o poder administrativo tem como principal característica.
Dando uma maior relevância ao princípio da legalidade, o mesmo comporta três exceções, sendo a que tem um maior impacto neste caso, o estado de necessidade. Ou seja, em circunstâncias excepcionais, de verdadeira necessidade pública, a Administração pública, se for exigida pela situação, fica dispensada de seguir o processo legal, ainda que possa implicar o sacrifício de direitos dos particulares. Posto isto, concordamos que Portugal se encontrava num estado de necessidade, contudo, no nosso entender um cabeleireiro, não se encontra dentro das bases institucionais da Teoria do Estado de necessidade, como um serviço básico. A conferência procedimental é uma forma de exercício conjunto de competências administrativas, prevista nos artigos 77.º e seguintes do Código de Procedimento Administrativo, cujo objetivo é promover a eficiência, a economicidade e a celeridade da atividade administrativa. Muitas vezes, as pretensões dos interessados perante a Administração Pública não dependem da competência de um único órgão administrativo, pressupondo a necessidade de obter atos permissivos ou pareceres por parte de uma multiplicidade de órgãos administrativos. Uma vez excluída a possibilidade de ser um serviço urgente, perante um Estado de Necessidade, o procedimento para a alienação do espaço, tem de ocorrer no regime aplicável, sob legalidade do direito administrativo, nomeadamente, a Lei 75/2013, de 12 de setembro, artigo nº 33/1. À luz deste artigo, competia ao Município prosseguir o nele disposto. Assim sendo, a incompetência ocorre quando um órgão ou pessoa coletiva extravasa as suas competências (artigo nº161/2 alínea b).
Os prazos fixados na lei para a ação de impugnação de atos administrativos anuláveis são diversos, consoante o autor seja o Ministério Público (1 ano) ou outros interessados (3 meses), é o que dispõe o artigo 58.º/2 do CPTA. O prazo relevante é o mais longo, justamente aquele que ao Ministério Público assiste, uma vez que só decorrido o mesmo é que o ato se torna impugnável contenciosamente. Desta forma, tendo que se decorreram 3 anos após os atos sucedidos, considera-se que houve uma nítida violação do prazo legal a recorrer.
Decisão
Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Administrativo:
A Associação de Cabeleireiros teria toda a legitimidade e legalidade, nos termos do artigo 161º/2 al. b), no âmbito de aplicação da Lei 75/2013, de 12 de setembro, artigo nº 33/1 e, sobre violação do disposto no artigo 7º do CPA, para requerer a nulidade do ato.
Assim, o artigo 58/1 do CPTA afirma que quando estamos perante um ato nulo não existe prazo para requerer, por conseguinte a Associação de Cabeleireiro à luz do coletivo de juízes tem toda a razão para arguir as alegações sendo portanto os atos sancionatórios direcionados para o Município, para a empresa Linha mais Próxima e empresa REVIVRE.
O colectivo de Juízes declara que há sanação de nulidade, tornando os efeitos no ordenamento jurídico.
Beatriz Cruz Nº67764
Margarida Garcia nº67783
Emilia Sebastião nº67169
Sub 10 Turma B
Defesa dos Advogados da Revivre Paris Ailleurs
Argumentos da defesa da Empresa Revivre Paris Ailleurs;
A RPA é uma empresa privada que colabora com a entidade pública no sentido de pagar os salários dos seus colaboradores.
A RPA é, portanto, um sujeito totalmente privado que entra em colaboração com a LMP para o efeito já designado tendo, aliás, a empresa sido constituída com esse propósito.
- Da ação da Administração Pública -
Por outro lado, é missão da administração pública a prestação e garantia de serviços, bem como o seu fomento. Por força de normas europeias, os mesmos inserem- se num conceito amplo de Serviço de Interesse Geral, que consistem em atividades que, mesmo quando praticadas por atores de mercado, justificam uma regulação pública mais intensa do Estado.
O aparelho Administrativo realiza, inclusive, vários tipos de missões na economia, representando formas de intervenção diferentes. A economia, enquanto espaço de fluxos e relações económicas, representa um campo que, no interesse público, requer intervenção estatal. Assim, surgem mecanismos de controlo da atividade económica, desde licenças a ações de controlo e fiscalização.
A ação reguladora do Estado consiste numa intrusão no campo económico no sentido de fazer com que os agentes adotem determinadas condutas que espontaneamente estes não adotariam. Desta forma, o funcionamento eficiente do mercado é uma missão do Estado pelo 81º/f) CRP.
Uma forma de intervenção do Estado é a de atribuição de apoios às empresas com o objetivo de estimular setores da economia. Em termos formais costuma ser por subvenção ou por subsídio, verbas diretas do orçamento da entidade pública direcionadas à dinamização do mercado.
O Estado, porém, pode ter uma intervenção direta de aquisição de bens e serviços. Aqui, estamos perante uma ideia de public procurement, da compra de bens pelo Estado e também da sua atuação como agente económico. Esta compra é regulada pelo CCP.
- Da constituição da Revivre –
A atuação pública sobre o Direito Privado não é proscrito, na medida em que a atuação da AP seria sempre submetida a vinculações de Direito Público expressas, por exemplo, no CPA. Não se trata, portanto, de uma questão de competência, mas do cumprimento de um postulado de eficiência na atuação administrativa. No entanto, essa atuação deverá ser sempre guiada pelo critério do interesse público, nunca sendo igual à dos particulares (que têm, á partida, o lucro como finalidade), seguindo um princípio de adequação nas normas a serem usadas. É um Direito Privado publicizado.
Dependendo de uma norma habilitadora, cremos que basta olhar para o facto da LMP ser constituída segundo a lei comercial. O Autor Guido Corzo, porém, fala de uma liberdade ab initio de escolha da forma da atuação, inerente à sua natureza com personalidade privada.
Aliás, é mesmo consagrado no 278º CCP o princípio da autonomia pública contratual, permitindo à AP descer do seu "pedestal" e agindo em pé de igualdade com os particulares, assente ou na lei ou na natureza das relações estabelecidas. Não obstante, a doutrina entende que é uma figura marginalizada pelos regimes existentes.
O uso do Direito Privado pela Empresa Local não pode ser posto em causa, na medida em que advém de um imperativo de igualdade e de concorrência fruto da sua natureza e campo de atuação, uma "reserva de Direito Privado".
O CPA, nos seus artigos 200º e ss. dá prova de vida dos contratos de Direito Privado da Administração Pública. Nos termos do 201º/1 CPA, podem ser diferenciados os contratos que envolvem prestações possíveis de estarem subordinadas à concorrência do mercado e os em que tal não se verifica. Ou seja, contratos de Direito Privado da AP cujo objeto é passível de contrato administrativo ou não. A decisão de adotar um contrato de Direito privado na mesma reveste a natureza de ato.
O exemplo paradigmático apresentado por MRS é exatamente o contrato de trabalho. É de Direito Privado na medida em que ou consiste em interesses particulares de atuações privadas jurídico-administrativas ou numa atuação fora das atribuições por entidades públicas.
Claramente, a atuação da AP, mesmo sob o Direito Privado, deve ser pautada pelo interesse público e em respeito das reservas de Direito Administrativo. Todos os contratos têm vinculações jurídico-públicas. Constituem, portanto, atuações conforme o domínio privado da administração.
Desta forma, a ação insere-se numa progressiva privatização da administração pública, quer na vertente do Direito regulador, da privatização do acesso a atividades e dos intervenientes na atividade administrativa e dos critérios substantivos da decisão administrativa, que pauta a conduta por conceções económicas. Na medida em que a atuação é comercial, pode falar-se numa verdadeira reserva de Direito Privado.
A aquisição do espaço e equipamento já nada tem que ver com o nosso cliente, nem é impugnado, bem como é tipificado no CCP.
- Da venda do espaço e equipamento à Revrive -
É alegado que a venda não respeita as leis de contratação pública devendo o imóvel ter sido publicitado em concurso público, contudo, tolda-nos uma visão diferenciada dos factos :
A Revivre tinha, durante o período Covid, assegurado a manutenção dos serviços de interesse público e cariz social visados pelo munícipio, tendo cumprido ditosamente estes. Mais a mais, demonstrou coesa responsabilidade e eficiência para o desempenho da tarefa (como foi corroborado pelas várias testemunhas).
Por outro lado, o concurso público, via que nos é apontada pela contraparte, trata- se de um procedimento "cego" a fatores como as provas dadas previamente (sendo isso, quanto muito, um critério de desempate entre propostas), bem como em nada recompensaria a Revivre pelo labor já desempenhado durante a crise pandémica (visto que não foi ajustado nenhum mecanismo como um Direito de Preferência aquando do
contrato). Por outro lado, a utilidade adjacente a esta cedência não seria espelhada em contratação pública, entenda-se – não se procurava fazer a alienação do espaço com vista á obtenção de recursos, mais uma vez o lucro não era o fim, antes era a manutenção e prossecução daquele serviço tão importante á população – pelo que a cedência é um meio para atingir esse fim – assegurar que a Paris em Linha tem um local aonde possa laborar, pois, sem este, não consegue cumprir os seus desígnios.
Repescando a argumentação feita quanto á cegueira do concurso público, entende assim, esta parte, de que seria uma manifesta violação do Princípio da Igualdade (espelhado em lei constitucional e vertida como princípio administrativo no Código de Procedimento Administrativo) colocar a Revivre a concurso com outras quaisquer entidades (note-se, igualmente, que em momento nenhum qualquer elemento da contraparte alega a violação do procedimento como feitor de um dano na sua esfera por não ter tido a chance de concorrer para a aquisição daquela loja e consequente prossecução do serviço, o que nos leva a querer que não haveria assim interesse da contraparte em concorrer ao concurso que alegam ser mister) pois não seriam nunca tido em conta o desempenho prévio da Revivre.
Mais ainda, consideramos que a ratio daqueles que são os procedimentos de contratação pública – o garante de produzir uma finalidade de Interesse público pelas mãos de um sujeito privado que assegure os princípios da Boa-administração – ficou, pela venda da loja à Revivre, assegurada. Isto porque, não é economicamente quantificável a prestação de um serviço ao nivel do prestado pela Revivre, nem o cumprimento estrito das normas de segurança como a Revivre cumpriu. Por estes factos, acreditamos que corre, com certeza, o cumprimento da função de interesse público a custos que, a serem desenvolvidos por qualquer outro privado, seriam decerto mais elevados (atente-se que a Revivre é uma empresa privada mas que, desde a sua constituição, visa promover interesses públicos e não o escopo lucrativo, algo que não se encontraria em mais nenhum agente privado). A resguardar a argumentação supra – o cumprimento da ratio das normas de procedimento por uma via alternativa – encontramos o disposto no artigo 163º/5 b) CPA e princípio vetor que pode ser retirado desta disposição, pelo que, em cumulação de pedidos, segundo o disposto no artigo 4º/2 d) CPTA, atentamos a este coletivo de juízes que aproveite, analogamente para este caso concreto, o princípio vetor que se retira desta disposição – caso decida pela nulidade do processo ; ou aplique diretamente esta escusa patente no artigo supra – caso decida pela anulabilidade do processo. Devendo, a nosso
ver, entender-se que, como apelamos, o recurso a contratação pública, neste caso concreto, redundaria numa violação dos princípios já apresentados, bem como do princípio da proporcionalidade, disposto no artigo 7º CPA, e do princípio da Boa-fé do artigo 10º CPA, visto que existe uma tutela da confiança da Revivre, preenchida e alimentada pela atuação do Município que cria nesta expectativas legítimas de que o labor deste cabeleireiro não estará em risco (o que se acontecerá se esta loja for retirada á Revivre).
Caso o coletivo de juízes assim não entenda, refutamos as pretensões da contraparte e cremo-las ilegítimas por conta dos seguintes argumentos :
- Inexistência de conflitos de concorrência –
Por se tratar de uma atuação em benefício da população – Ação Social – permitimo-nos a preencher as cláusulas de exclusão da norma excecional que é o artigo 10º desta lei (Lei n.º 19/2012 de 8 de maio – Regime da Concorrência) :
Artigo 9.º
Acordos, práticas concertadas e decisões de associações de empresas
- - São proibidos os acordos entre empresas, as práticas concertadas entre empresas e as decisões de associações de empresas que tenham por objeto ou como efeito impedir, falsear ou restringir de forma sensível a concorrência no todo ou em parte do mercado nacional, nomeadamente os que consistam em:
- Fixar, de forma direta ou indireta, os preços de compra ou de venda ou quaisquer outras condições de transação;
- Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos;
- Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento;
- Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes, colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência;
- Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros contraentes, de prestações suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm ligação com o objeto desses contratos.
- - Exceto nos casos em que se considerem justificados, nos termos do artigo seguinte, são nulos os acordos entre empresas e as decisões de associações de empresas proibidos pelo número anterior.
Artigo 10.º
Justificação de acordos, práticas concertadas e decisões de associações de empresas
- - Podem ser considerados justificados os acordos entre empresas, as práticas concertadas entre empresas e as decisões de associações de empresas referidas no artigo anterior que contribuam para melhorar a produção ou a distribuição de bens ou serviços ou para promover o desenvolvimento técnico ou económico desde que, cumulativamente:
- Reservem aos utilizadores desses bens ou serviços uma parte equitativa do benefício daí resultante;
- Não imponham às empresas em causa quaisquer restrições que não sejam indispensáveis para atingir esses objetivos;
- Não deem a essas empresas a possibilidade de eliminar a concorrência numa parte substancial do mercado dos bens ou serviços em causa.
- - Compete às empresas ou associações de empresas que invoquem o benefício da justificação fazer a prova do preenchimento das condições previstas no número anterior.
- - São considerados justificados os acordos entre empresas, as práticas concertadas entre empresas e as decisões de associações de empresas proibidos pelo artigo anterior que, embora não afetando o comércio entre os Estados membros, preencham os restantes requisitos de aplicação de um regulamento adotado nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
- - A Autoridade da Concorrência pode retirar o benefício referido no número anterior se verificar que, em determinado caso, uma prática abrangida produz efeitos incompatíveis com o disposto no n.º 1.
A estarmos perante uma situação de concorrência ilícita, teriam que despertar o Artigo 9º/1 alínea d) perante o acordo entre a LMP e a RPA quanto aos seus efeitos (visto que o substrato da venda/acordo nunca visou atingir os concorrentes) . A mesma acusação, afastamos por via da justificação do disposto no artigo 10º/1, visto que, aquele acordo viabilizou a prossecução de um serviço higiénico, de beneficiência, aos cidadãos da Linha, leia-se, contribuiu para melhorar a produção de serviços desta espécie que escasseavam naquela localidade, preenchendo, ainda, as respetivas alíneas a) ; b) e C), para as quais operam a subsunção dos seguintes factos, respetivamente:
- Os utilizadores têm à sua disposição um serviço financiado pelo Município que lhes permite, a baixos custos, garantir a manutenção da sua boa imagem (tenha-se em conta o peso da mesma para a dignidade da pessoa humana), reservando assim para estes beneficiários um serviço que, a custos totalmente privados, seria manifestamente superior.
- Enquanto que os restantes serviços do mesmo tipo primam por oferecer serviços personalizados, de qualidade e diferenciados (como chamarizes de clientes), o serviço em causa apenas procura, dentro do exercício genérico dos serviços de cabeleireiro, garantir a segurança higiénica dos clientes, pelo que, as restrições, a existirem, serão apenas numa franja curta de clientes que valorizem mais a higiene em detrimento do serviços personalizado, pelo que, apenas esses, por corresponderem estritamente ao escopo da Revivre, são indispensáveis ;
- Em consonância com o último ponto, há que aqui reforçar a materialidade subjacente a este serviço – a prossecução de cariz social, de um meio de assegurar a manutenção da imagem estética dos cidadãos, em valorização da sua dignidade, com respeito e estima pelas regras de segurança e higiene - .
Não pode assim, este serviço ser assegurado por privados, tal como, por não ser essa a sua materialidade, não pode ou não deve, este cabelerireiro, Paris em linha, prosseguir uma atuação predatória do mercado, visto que, a sua finalidade última não é a verificação
de lucro, o que não conduzirá nem motivará, como motiva á restante "concorrência", a aposta em produtos e serviços de qualidade ou personalizados como atração de clientela. Apenas se quer manter, no municipio, a possibilidade de, para os que prezam a sua segurança antes da beleza, terem acesso a um serviço que se mostra essencial. Não havendo assim possibilidade de ser eliminada parte substancial da concorrência.
- Estado de Necessidade Administrativo –
Decorrente e validado pelo disposto no artigo 3º/2 CPA, este diploma compreende que existem situações da vida real em que, pela sua especial gravidade ou perigosidade, a Administração Pública tem o poder legal de efetuar uma intervenção imediata, sob pena de, se for mais demorada, se frustrar a possibilidade de atingir os fins de interesse público postos por lei a seu cargo. A urgência é uma realidade ordinária, ainda que eventual da ação da administração pública, visto que está prevista na lei para situações em que ocorra um perigo atual e iminente que ameace a satisfação de um interesse publico legalmente protegido e imponha uma atuação imediata e inadiável, mas apenas tem lugar quando se verifiquem situações de perigo. Por outro lado, os procedimentos em urgência traduzem formas simplificadas de agir (ex. 26º/2 CPA) e a atuação administrativa urgente está em qualquer caso prevista na lei- é uma atuação legal especial, e não uma atuação excecional. Tanto a urgência como o estado de necessidade se mostram enquadrados na ideia de exigência pública de ação imediata da Administração e importam a legitimação de atuações que, à luz das normas consagradas, seriam inválidas.
A atuação em estado de necessidade tem como finalidade primária a reposição da situação de normalidade legal ou de facto, enquanto que a atuação urgente tem como finalidade primeira o agir sem delongas para a satisfação de finalidades especificas definidas pela lei. A determinação dos pressupostos de verificação do estado de necessidade é mais rigorosa que a atuação urgente, pois a administração passa a ter poderes extraordinários, devendo estes ser utilizados na medida exata do necessário para restabelecer a posição (na urgência a lei é que determina os poderes especiais e tendo como finalidade satisfazer de modo imediato o interesse público, há menos restrição quanto à atuação).
O estado de necessidade, nas palavras do Professor Sérvulo Correia reflete : Os. "limites da possibilidade da capacidade omnicompreensão e omniestatuição do legislador contemporâneo e o imperativo de compensar esse enfraquecimento da lei graças a outras soluções jurídicas capazes de responder aos requisitos do Estado de Direito (…). Sendo orientado pelo princípio da prossecução do interesse público e pelo princípio da primazia do fim sobre forma permissão normativa de atuação administrativa discrepante das regras estatuídas, como modo de contornar ou atenuar um perigo iminente e atual para um interesse público essencial, causado por circunstância excecional não provocada pelo agente, dependendo a juridicidade excecional de tal conduta da observância de parâmetros de proporcionalidade e brevidade e da indemnização dos sacrifícios por essa via infligidos a particulares."
Desta forma, face a uma possível extinção da LMP pelo desaparecimento do substrato (a situação pandémica em que tinha sido criada), bem como atestando às dificuldades de funcionamento do estabelecimento, confirma-se uma situação de urgência administrativa que admite a preterição das formalidades legais.
Admitimos, contudo, que possa ser cogitada a existência de tratamento distinto ou especial, o que contrariaria o principio da imparcialidade (artº 9º CPA ).
Para análise do paragrafo supra, convocam-se uma série de critérios a ter em conta em abstrato, devendo, no caso concreto, ponderar se há algo de sancionável.
Assim, interessa saber se as garantias de imparcialidade foram respeitadas e, para o efeito, na terceira secção do CPA está consagrado o regime aplicado ao processo de imparcialidade, bem como da escusa à sanção aplicável, que só são aplicáveis caso estejam preenchidas as situações do 69º/1.
Artigo 69.º
1 - Salvo o disposto no n.º 2, os titulares de órgãos da Administração Pública e os respetivos agentes, bem como quaisquer outras entidades que, independentemente da sua natureza, se encontrem no exercício de poderes públicos, não podem intervir em procedimento administrativo ou em ato ou contrato de direito público ou privado da Administração Pública, nos seguintes casos:
- Quando nele tenham interesse, por si, como representantes ou como gestores de negócios de outra pessoa;
- Quando, por si ou como representantes ou gestores de negócios de outra pessoa, nele tenham interesse o seu cônjuge ou pessoa com quem viva em condições análogas às dos cônjuges, algum parente ou afim em linha reta ou até ao segundo grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem vivam em economia comum ou com a qual tenham uma relação de adoção, tutela ou apadrinhamento civil;
- Quando, por si ou como representantes ou gestores de negócios de outra pessoa, tenham interesse em questão semelhante à que deva ser decidida, ou quando tal situação se verifique em relação a pessoa abrangida pela alínea anterior;
- Quanto tenham intervindo no procedimento como perito ou mandatário ou hajam dado parecer sobre questão a resolver;
- Quando tenha intervindo no procedimento como perito ou mandatário o seu cônjuge ou pessoa com quem viva em condições análogas às dos cônjuges, parente ou afim em linha reta ou até ao segundo grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem vivam em economia comum ou com a qual tenham uma relação de adoção, tutela ou apadrinhamento civil;
- Quando se trate de recurso de decisão proferida por si, ou com a sua intervenção, ou proferida por qualquer das pessoas referidas na alínea b) ou com intervenção destas.
- Excluem-se do disposto no número anterior:
- As intervenções que se traduzam em atos de mero expediente, designadamente atos certificativos;
- A emissão de parecer, na qualidade de membro do órgão colegial competente para a decisão final, quando tal formalidade seja requerida pelas normas aplicáveis;
- A pronúncia do autor do ato recorrido, nos termos do n.º 2 do artigo 195.º
- - Sob pena das sanções cominadas pelos n.º 1 e 3 do artigo 76.º, não pode haver lugar, no âmbito do procedimento administrativo, à prestação de serviços de consultoria, ou outros, a favor do responsável pela respetiva direção ou de quaisquer sujeitos públicos da relação jurídica procedimental, por parte de entidades relativamente às quais se verifique qualquer das situações previstas no n.º 1, ou que hajam prestado serviços, há menos de três anos, a qualquer dos sujeitos privados participantes na relação jurídica procedimental.
- - As entidades prestadoras de serviços no âmbito de um procedimento devem juntar uma declaração de que se não encontram abrangidas pela previsão do número anterior.
- - Sempre que a situação de incompatibilidade prevista no n.º 3 ocorrer já após o início do procedimento, deve a entidade prestadora de serviços comunicar desde logo o facto ao responsável pela direção do procedimento e cessar toda a sua atividade relacionada com o mesmo.
Não se verificando o preenchimento de nenhuma das alíneas supra mencionadas, este regime não deve ser aplicado, não havendo problema de parcialidade, tendo sido respeitado o artº 9 CPA.
- Afastamento do efeito anulatório por Aproveitamento do Ato –
A anulabilidade é o "desvalor residual" presente na lei, ocupando o primeiro patamar sancionatório de atuações em violação da lei, abrangendo quer os atos administrativos bem como os contratos desde que os atos procedimentais em que se fundem sejam inválidos. A mesma funciona, portanto, aquando de violações da juridicidade que não acarretem consigo outra consequência.
De notar que o aproveitamento do ato, em Direito Administrativo, diz respeito à atuação da AP, isto porque, as novas tarefas da AP requerem a consideração de muitas incógnitas, pelo que a dogmática da tarefa de previdência do futuro, aspeto central da AP infraestrutural, comporta o risco da inconformação da realidade e da preterição de realidades procedimentais. O aparelho legislativo não pode prever todas as imprevidências da função executora própria da AP, pelo que se contenta com cláusulas gerais. A discricionariedade administrativa é um exemplo dum epifenómeno desta realidade.
A pré definição de realidades a seguir é feita, de forma paramétrica e enquadradora, de forma primária pelo procedimento, valendo como palco de geração e construção do sentido na norma de acordo com o que se tem de decidir administrativamente, sendo indispensável a atribuição de valor de referência material jurídico-administrativo.
Nem sempre, porém, a anulabilidade das condutas administrativas contrárias à juridicidade gera a possibilidade de anulação judicial, como no 163º/5, 283º/4, 283º-A, 285º/1 (remissão para o regime do ato quando possa ter forma de ato) CCP:
Invalidade consequente de atos procedimentais inválidos
Artigo 283.º
1 - Os contratos são nulos se a nulidade do acto procedimental em tenha assentado a sua celebração tenha sido judicialmente declarada ou possa ainda sê-lo.
2 - Os contratos são anuláveis se tiverem sido anulados ou se forem anuláveis os atos procedimentais em que tenha assentado a sua celebração, devendo demonstrar-se que o vício é causa adequada e suficiente da invalidade do contrato, designadamente por implicar uma modificação subjetiva do contrato celebrado ou uma alteração do seu conteúdo essencial.
3 - (Revogado.) 4 - O efeito anulatório previsto no n.º 2 pode ser afastado por decisão judicial ou arbitral, quando, ponderados os interesses públicos e privados em presença e a gravidade da ofensa geradora do vício do ato procedimental em causa, a anulação do contrato se revele desproporcionada ou contrária à boa-fé.
O prazo para anulação do ato encontra-se no 58º/1 CPTA para os atos e 77-B CPTA. Quanto tempo passou desde a impugnação para anulação judicial? Não sabemos. Decorrido o prazo, não há sanação da invalidade, mas a atuação torna-se inatacável e os seus efeitos mantêm-se no ordenamento, numa equiparação com os atos lícitos. O decurso do tempo, como se vê, pode convalidar certos atos, tornando-os inimpugnáveis, num efeito apagador da memória da invalidade administrativa.
A irregularidade é uma inversão do princípio da juridicidade, na medida em que consiste em violações do ordenamento que o mesmo consente, num incumprimento venial da juridicidade. Não pode, portanto, ser anulada com fundamento na irregularidade.
A nosso ver, o afastamento do efeito anulatório, presente no 163º/5 CPA, enquadra o caso na sua alínea c), na medida em que, como mencionado, face às circunstâncias de gestão do Paris em Linha, bem como dos serviços à comunidade, a AP procede à prática de um ato que lhe confere uma "vantagem" na alteração formal da detenção do espaço, onde a realidade material decorreria da mesma forma. A atribuição do imóvel decorre da própria vontade da AP.
Note-se, também, a substituição da faculdade presente no anteprojeto do CPA. a irregularidade atua imperativamente, possivelmente como fruto da necessidade de proteção do ordenamento face aos valores plasmados normativamente. Assim, face ao efeito anulatório, primeiro passo de resolução, o mesmo é afastado pelo 163º/5 CPA. Não é uma sanação do ato, mas a blindagem do ato pelos valores normativos, funcionando como pressuposto negativo da anulação judicial e administrativa.
Desta forma, o artigo mencionado pretende a sua aplicação a todos os vícios possíveis do ordenamento, aplicando-se ao regime geral anulatório do ato, afastando também pretensões indemnizatórias. Afasta-se, assim, do ordenamento alemão, que apenas toma em conta vícios formais.
O articulado segue, atuando sob princípios de celeridade e economicidade da atuação da AP, de coincidência entre a decisão hipotética e a decisão viciada.
• Alínea a)= Impossibilidade de atuação divergente, de competências vinculadas
• Alínea b)= indisponibilidade fáctica de uma alternativa, ou seja, que o vício não tenha influenciado o conteúdo decisório do ato. (critérios de justiça na seleção da entidade a quem se vende o imóvel e equipamento). É necessário apenas aferir se o vício era passível de influenciar a decisão tomada, em vez de provar que este não foi determinante;
• Alínea c)= não obstante se verificar a inobservância de requisitos procedimentaisformais, o fim das normas foi ainda acautelado e atingido. Aqui vamos pela justiça da própria decisão da AP.
Mesmo que se considere que a atuação não se subsume a nenhuma das alíneas do CPA ou CCP nos termos da irregularidade, a doutrina admite que os tribunais podem reconduzir uma situação, no espírito do sistema, à situação de irregularidade, tornando as normas mencionadas cláusulas abertas ao juiz, seguindo um princípio de aproveitamento do ato administrativo que, embora estejamos perante um vício formal, que se subsume mais facilmente à alínea b), também a as alíneas a) e c) consentem a serem subsumidos a vícios formais.
- Conclusão da Argumentação -
Cremo, tendo em conta toda a argumentação supra, assim como feitas as pretensões desta defesa, que se note que a conceção da irregularidade deve consistir numa ponderação da situação concreta e não na estrito análise das normas procedimentais estatuídas, uma vez que se justifica a conduta que, aparentemente, é contrária à juridicidade quando se faz um "pesar" de outros bens jurídicos da administração, aliás presente nos artigos mencionados do CCP.
No caso de uma consideração de nulidade das atuações, nem mesmo a nulidade é totalmente absoluta, devendo ser tomado em conta os seus efeitos putativos e favoráveis aos particulares, primando-se, tudo ponderado, pelo aproveitamento do Ato.
Contudo, esta parte reconhece perante uma atuação em Estado de Necessidade administrativa possa haver espaço a indemnizações, não pela preterição do processo mas sim por algum dano que eventualmente possa ter ocorrido na esfera da contraparte (devendo, a nosso ver, esta contraparte fazer prova desse dano), pelo que avançamos com um pedido de mudança da base do processo por via do disposto no artigo 45º em conjunto com a extensão do regime pelo artigo 45º-A /1, A) do CPTA.
António Matos
António Rodrigues
Marco Magriço
Simulação de Administrativo II
Advogados da Câmara do Município
Perguntas para as testemunhas:
1- Senhora que começou a trabalhar lá
Srª Constança, tivemos conhecimento de que, à data de abertura, começou a exercer funções no Salão. De que modo isso impactou a sua vida e, para além disso, considerou urgente esta decisão?
Eu fiquei desempregada e com 5 filhos para sustentar quando apareceu o covid-19. Desde então que tenho tentado arranjar trabalho, mas as oportunidades não foram muitas e as que apareciam, não apresentavam as condições mínimas decentes para poder trabalhar em segurança, já que sofro de uma doença respiratória e tenho de ter cuidado para não me infetar. Foi neste contexto que descobri a possibilidade de trabalhar no Salão. Foi a melhor decisão que poderia ter tomado! Trabalho desde então em condições decentes de proteção para a minha saúde, já que me disponibilizam uma farda especial imunizadora para garantir a minha proteção à exposição do vírus, e a de todos os outros funcionários e utentes, o que me deixa descansada quanto à vulnerabilidade que apresento. Esta decisão foi muito urgente para mim porque estava totalmente desesperada: sou mãe solteira e vivia de ajudas familiares que mal chegavam para pagar as contas da casa. Já havia pouca comida e não havia dinheiro para os meus medicamentos pessoais para a ansiedade que sofria na altura da pandemia e, para além disso, sofri muitos ataques de pânico devido a toda a circunstância. Foi um autêntico milagre
2- Influencer
Srª. Madalena, qual é a sua profissão e porque é que este cabeleireiro foi importante para o exercício da sua profissão?
Eu sou influencer digital, mas o meu conteúdo baseia-se somente na promoção da indústria dos cabelos. Partilho produtos, técnicas, cortes, estabelecimentos, entre outras coisas.
A minha profissão é bastante instável, porque tanto a marca quer trabalhar comigo como de repente arranja outra pessoa. Principalmente quando começou o covid eu perdi imensas parcerias, pois bastante cabeleireiros começaram a fechar devido ao isolamento obrigatório.
No entanto, a construção deste cabeleireiro veio salvar as minhas finanças. Eu estava numa situação em que para proporcionar o conteúdo que os meus seguidores queriam eu precisava de ir ao cabeleireiro quase diariamente pois eu mostrava a realidade dos produtos testando-os no meu cabelo.
Este cabeleireiro foi o único que conseguiu transmitir segurança visto os tempos que corriam, os funcionários utilizavam fardas especiais imunizadoras que protegiam tanto o funcionário como o cliente.
Graças a este cabeleireiro consegui manter a profissão que tanto lutei para conseguir e consegui manter-me bonita mesmo em tempos de terror.
3 - Senhora que tinha depressão
Srª. Constança Agostinho, soubemos, especificamente, sobre o impacto positivo que o cabeleireiro teve em si, durante a pandemia do COVID-19. Poderia esclarecer-nos, melhor, de que maneira isso ocorreu?
Eu, uns meses antes da pandemia, comecei a ter uns problemas de saúde que me fizeram perder parte do cabelo em pontos localizados. Neste sentido, isto tornou-se um facto embaraçoso para mim e fez com que eu me isolasse muito e, devido a isso, desenvolvi uma depressão, que foi diagnosticada. Além disso, os problemas de saúde dos quais falei, e a respetiva medicação, que são imunossupressores, fazem com que tenha muito pouca resistência a doenças e vírus
No cabeleireiro que a câmara abriu, não só encontrei pessoas altamente profissionais, que conseguiram arranjar forma de não se notar a perda de cabelo o que teve um impacto extremamente positivo na minha autoestima como encontrei também um local onde voltei a conviver com pessoas e onde me sinto segura em termos de saúde.
Quando lá ia, encontrava lá sempre um sorriso e uma cara amiga. Este cabeleireiro passou a ser um lugar fundamental para a minha auto-estima e bem estar pessoal.
Perguntas para os peritos
1 - Médico Psiquiatra
Desde o começo da pandemia, notou algum crescimento da afluência aos serviços hospitalares?
Sim. Sem dúvida.
A Pandemia foi uma fase muito difícil na vida de todos nós. Posso dizer que fiz muitos turnos seguidos e que passavam dias em que não ia a casa.
O que posso dizer? Todos nós acompanhámos as notícias diárias. Os hospitais estavam cheios, definitivamente houve uma grande afluência aos serviços hospitalares.
Foi um período muito complicado, e, que graças a deus, já ultrapassámos.
Reforço que neste período, as pessoas tendem a considerar que só existiram lesões físicas, nomeadamente, respiratórias.
No entanto, a pandemia foi um período muito conturbado/controverso, também, para a mente humana. Existem vários estudos que comprovam o registo do aumento do número de depressões, casos de ansiedade patológicas e inúmeras outras doenças do foro psicológico. Eu próprio acompanhei este aumento.
2 - Proteção Civil
Segundo o relatório que a proteção civil emitiu, notámos que foi realizada uma análise sobre o impacto e a necessidade da construção de um cabeleireiro. Pode-nos esclarecer o fundamento para a realização do mesmo?
Os efeitos psicológicos decorrentes da pandemia configuram-se como riscos de saúde à população, onde os casos mais graves podem traduzir-se, além da saúde mental, em riscos à saúde e integridade física da população, como automutilações e tentativas de suicídio. Sendo a saúde e proteção civil atribuições do município, são portanto finalidades que devem ser prosseguidas por este órgão, que traduzem-se, também, na salvaguarda do interesse público e interesses próprios da população, em harmonia com o princípio da prossecução destes tipificado no artigo 4° do Código do Procedimento Administrativo. Com a implementação do distanciamento social e medidas de segurança, quanto à higiene, para evitar a transmissão do vírus, a instalação de um salão de um cabeleireiro postulou-se como uma maneira de promover uma socialização moderada e segura, com baixíssimo risco de transmissão da COVID-19, sendo neste raciocínio preferível a, digamos, um estabelecimento de restauração. Desta forma, o salão de cabeleireiro mostrou-se essencial à Administração Pública, para prosseguir as suas atribuições e garantir o bem estar da população.
3- Presidente da Câmara
Sendo eu a Presidente da Câmara, foi autorizado por mim o despacho n•77/ 2020 com vista ao interesse e a necessidade pública, mostrando, deste modo, transparência no meu ato.
Face à situação da COVID-19, tomou-se medidas extraordinárias para apoiar os habitantes do concelho. Instalando-se um salão de cabeleireiro em um espaço anteriormente utilizado como loja municipal, o salão foi equipado com tecnologia antivírus e fardas especiais imunizadoras para proteger tanto os funcionários quanto os clientes. Tendo como objetivo aumentar o bem-estar, a autoestima e a "alegria de viver" durante os tempos difíceis da pandemia.
Hipótese de estrutura:
Excelentíssimas Juízas,
O Município da Linha, através dos seus advogados, vem apresentar a sua defesa no âmbito da presente ação movida pela Associação dos Cabeleireiros da Linha.
Alegações finais
1- Urgência
Como todos sabemos, a situação da pandemia foi inesperada. De facto, houve uma alteração das circunstâncias, e, por isso, no que diz respeito a regras jurídicas e à vida das pessoas, temos que ser mais flexíveis.
Critérios para determinar a urgência: necessidade imediata: a situação exige uma resposta rápida devido a circunstâncias imprevistas ou emergenciais; risco para a saúde ou segurança: se a demora puder afetar a saúde ou a segurança pública, a urgência é justificada; dificuldade de cumprir prazos normais: quando não é possível cumprir os prazos normais de procedimento de contratação, como licitações, devido a circunstâncias específicas; impossibilidade de prever antecipadamente.
Como se viu, a dona Constança estava de facto com depressão, não acham, senhoras juízas, que isto é uma situação de urgência? É a saúde que está em causa, um direito fundamental consagrado na CRP (art 64º). E se têm dúvidas em relação a isto, faço-me acompanhar dos relatórios médicos, que nos foram fornecidos pelos respectivos pacientes e foi-nos dada autorização para alegar isso em tribunal.
De facto, a despesa gasta com a abertura do cabeleireiro não estava prevista no orçamento. No entanto, como já disse, o processo era urgente e, como tal, tendo em consideração o decreto lei nº 10- A/2020, 13 de março, que estabelece medidas excepcionais e temporárias de resposta à epidemia, o município pôde fazê-lo. Este decreto consagra especificamente o regime excecional de contratação pública e de autorização de despesa, que permite a outorga de contratos por ajuste direto por motivos de urgência, a dispensa das regras do Código dos Contratos Públicos, um regime excecional da autorização de despesas, a produção de efeitos logo após a adjudicação e a isenção de fiscalização prévia do Tribunal de Contas.
A loja municipal a que correspondia o espaço, para além de não gerar lucro, já não se encontrava em efetividade de funções. Portanto, houve apenas um melhor aproveitamento do espaço para o bem coletivo e público, que no fundo é este o objetivo da câmara municipal.
2- Competências
A Câmara Municipal foi acusada de não ter competências para proceder à instalação de um salão de cabeleireiros. Ora, primeiramente, no quadro de competências e regime jurídico de funcionamento dos órgãos do municípios que constam da Lei nº 75/2013, de 12 de setembro, esta, no art.º 2 refere que constituem atribuições das autarquias locais a promoção e a salvaguarda dos interesses próprios das respectivas populações e, designadamente, nos domínios referidos no nº 2 do art.º 7 e no nº2 do art.º 23 da presente lei. Para além disso, no art 3º/c, são atribuídas competências às autarquias locais de investimento.
Ao observar o nº 2 do art.º 23, podemos inferir que os municípios dispõem de atribuições no domínio da saúde, da ação social e da proteção civil (alíneas g); h) e j)). Deste modo, o interesse comum esteve sempre em causa, e além disso, dentro do âmbito da competência do município.
O art.º 33/1 da mesma lei, refere que compete à câmara municipal participar na prestação de serviços e prestar apoio a pessoas em situação de vulnerabilidade, em parceria com as entidades competentes da administração central e com instituições particulares de solidariedade social, nas condições constantes de regulamento municipal (alíneas g) e v)) e, pode também executar as obras, por administração direta ou empreitada (alínea bb).
Deste modo, a câmara estará autorizada para executar a obra deste salão.
Por fim, na lei 50/2018 (LAL), de 16 de agosto, no art.º 14 a) é referido que é da competência dos órgãos municipais aprovar os planos municipais de emergência de proteção civil e uma vez que a mesma emitiu um relatório, a 25 de março de 2020, apelando à necessidade de emergência da instalação, optámos pela viabilização do mesmo, reforçando a ideia de que foi uma medida excecional.
Quanto à forma do ato (150º CPA), a Câmara respeitou esta disposição, uma vez que realizou um despacho, por escrito, a anunciar a instalação do salão. Deste modo, obteve eficácia (155º), uma vez que se procedeu, de imediato à sua construção, além disso, foi devidamente publicada (158º).
Como pudemos observar, a Câmara respeitou todos os requisitos para o processo de instalação do salão, desde a sua competência para tal, até às formalidades dos atos.
Dito isto, deixamos, então, uma reflexão aos senhores juízes. Como é que uma Associação pode acusar a Câmara de não ter agido sobre o exercício das suas funções e competências, o que já foi provado que é falso, quando não conseguem, sequer, respeitar o prazo de reclamação (Art.º 168/2 CPA), que dá lugar à sua rejeição, quando o recurso tenha sido interposto fora do prazo (Art.º 196/ 1 c) CPA). Ora, se o recurso foi interposto já após o decurso da pandemia, o prazo de 1 ano foi excedido e, para além disso, nessa altura, já não estávamos perante uma alteração de circunstâncias, uma vez que a fase de emergência já tinha chegado ao fim.
3- Audiência prévia
Excelentíssimos juízes, o Sr. Rodrigo mencionou a falta de audiência prévia. E, de facto, a falta de audiência prévia à decisão administrativa, quando não seja legalmente dispensada, constitui preterição de formalidade essencial. No entanto, esta foi legalmente dispensada. Em determinadas situações excepcionais, a lei prevê causas de exclusão da audiência prévia exatamente como dita o artigo 124º do cpa. Neste caso em específico, trata-se de uma decisão urgente, prevista no nº1alínea A) do mesmo artigo. Como todos sabemos, a pandemia de COVID-19 impôs desafios sem precedentes à Administração Pública, exigindo medidas ágeis e eficazes para proteger o bem-estar coletivo. Esta situação confere legitimidade, portanto à dispensa da audiência prévia, visto que esta poderia atrasar o objetivo final: oferecer um serviço essencial para a autoestima dos habitantes num momento de crise e, de certo modo, contribuir para uma melhoria na saúde e na oportunidade dos mesmos, como já pudemos verificar nos casos que prestaram depoimento.
Lamentamos profundamente o constrangimento que a situação possa ter causado ao Sr. Rodrigo mas foi uma decisão fundamentada.
Aliás, esta dispensa da audiência prévia exige uma fundamentação imposta pelo artigo 152º do CPA. O primeiro elemento a fundamentar é a situação que motivou a criação do cabeleireiro. Ora, tal como ouvimos o médico psiquiatra e a proteção civil, os dados sobre o impacto da pandemia na saúde mental da população revelou a urgência em agir. Seguidamente, demonstramos a compatibilidade da decisão com as normas jurídicas aplicáveis (153/1 cpa). E, para concluir e demonstrar que as formalidades foram cumpridas, o Município revelou sempre ser transparente relativamente às intenções de abrir o cabeleireiro, como demonstrado pelo despacho da Sra. Presidente, priorizando dia após dia a saúde mental do bom povo da Linha.
4- Imparcialidade
O art.º 266/2 CRP e 6º do CPA sujeitam a Administração Pública no exercício das suas funções ao princípio da imparcialidade, que vincula todos os órgãos da mesma, nas suas relações com os particulares, a agirem com isenção, objetividade e neutralidade, funcionando a transparência como corolário da imparcialidade. Assim, é-lhe imposto que se comporte de forma isenta em relação a todos os particulares, para garantir a igualdade de tratamento (6º CPA), através da aplicação uniforme de prosseguir o interesse público (266/1 CRP e 4º CPA)
Segundo o prof. Freitas do Amaral, o princípio da imparcialidade desdobra-se em duas vertentes, isto é, a vertente positiva, que estipula que o princípio da imparcialidade obrigue a que, na tomada de decisão, a Administração Pública pondere todos os interesses de carácter público ou privado. Todas as decisões da Administração Pública podem ser anuladas em sentença, sempre que haja um vício na decisão, logo este princípio constitui, um limite ao exercício do poder discricionário que visa proteger os cidadãos e funcionários da Administração.
No presente caso, embora a Câmara Municipal tenha aberto apenas um salão de cabeleireiros, em plena pandemia, devido ao surto de COVID-19, esta foi uma decisão de carácter urgente, tendo em vista o estado psicológico das pessoas, logo esta entidade pública agiu de acordo com o interesse público de toda a população Sendo assim, a Câmara precisou de tomar medidas extraordinárias e, para tal, agiu com celeridade (59º CPA), principalmente nesta situação, tendo em conta a urgência do processo.
Por fim, como todos sabemos, durante o tempo de pandemia apenas os serviços de saúde, tais como farmácias, hospitais, estavam abertos. Com a criação do cabeleireiro, a Câmara decidiu agir gradualmente no que toca à abertura de outros serviços, sendo este o pontapé de saída para o efeito e, esta optou por proceder à abertura do mesmo, em primeiro lugar, devido à excessiva importância do impacto que este serviço gera nas pessoas.
Carolina Araújo
Emilly Santos
José Lopes
Turma B10
Acusação - Associação de Cabeleireiros de Linha
Em representação da Associação dos Cabeleireiros de Linha
Como constatamos o mero reconhecimento constitucional dos direitos e interesses dos cidadãos consagrado no disposto do artigo 266/1 CRP, bem como a subordinação da Administração Pública à lei como é disposto no artigo 266/2 CRP, não bastou para afastar um cenário de infração, dos direitos dos particulares, pela Administração.
Face a este cenário de infração é necessário recorrer aos mecanismos contenciosos, de reação e defesa dos direitos dos particulares, perante os atos da Administração. A acusação visa garantir o reconhecimento dos direitos dos particulares, que foram manifestamente e sucessivamente violados, por demérito da ação administrativa.
Na tomada de decisões a Administração tem de respeitar as normas que estabelecem o procedimento administrativo. Conseguimos, portanto, identificar várias condutas ilícitas da Câmara Municipal, da Empresa Pública e da empresa "Revivre Paris Ailleurs". O artigo 2/1 CPA compreende a totalidade da atividade administrativa de gestão pública, quer quando desempenhada por órgãos da Administração, quer quando desenvolvida lateral ou ancilar mente por órgãos do Estado e das Regiões Autónomas não integradas na Administração. Assim sendo, concluímos que só a parte dedicada aos órgãos é unicamente aplicável à Administração Pública, todas as outras disposições são adequadas a quaisquer entidades, independentemente da sua natureza, no exercício de poderes públicos.
O disposto no artigo 2/3 CPA estabelece a existência de uma submissão da Administração Pública aos princípios gerais da atividade administrativa sendo que o legislador ordinário não pode dispensar a Administração Pública do cumprimento das disposições do CPA concretizadoras de normas constitucionais nem dos princípios gerais do CPA que, em rigor, são mais do que princípios da atividade administrativa.
O disposto no artigo 2/4 CPA, como destaca o professor Domingos Farinho, não menciona as Empresas Públicas, não obstante o 2/5 CPA, torna claro que, na relação com os procedimentos administrativos especiais, todas as normas de conteúdo das garantias do CPA – e não apenas as que densificam direitos fundamentais dos administrados – se aplicam na ausência de uma norma equivalente do regime especial em apreço.
Em suma, as Partes I (Princípios Gerais da Atividade Administrativa), III (Procedimento) e IV (Atividade Administrativa) aplicam-se a quaisquer entidades públicas que, sob um prisma funcional, possam ser integradas na Administração Pública.
Para além disso, todas as ditas "medidas extraordinárias" tomadas, pela administração,
não têm qualquer norma habilitante, violando o princípio da legalidade, sendo a
demonstração e prova destas alegações, o principal objetivo da acusação.
Da violação, geral, do princípio da persecução do interesse público pelo órgão
executivo colegial.
O Presidente da Câmara e o vereador responsável pela gestão da empresa pública, alegam que a sua atuação, de forma geral, respeitou sempre as atribuições do município. Ao longo do processo judicial será provado que estas alegações não correspondem à verdade. Antes de proceder a essa demonstração, devemos imediatamente abordar a alegação do Presidente e vereador, onde os mesmos afirmam que tomaram medidas extraordinárias, justificadas pela situação pandémica a fim de minimizarem os efeitos psicológicos nefastos, que esta trouxa à população de Linha.
Essas medidas, são justificadas com o argumento de terem sido vantajosas para a população, mas é incorreto fazê-lo, pois a função administrativa traduz-se por uma pluralidade de interesses públicos. A própria Constituição da República Portuguesa consagra, no disposto no artigo 266/1, a persecução do interesse público. O disposto neste artigo deve ser entendido como uma síntese dos interesses públicos, pois como sabemos nas situações concretas existe uma grande pluralidade, dos mesmos, a cargo das pessoas coletivas públicas, sob a forma das suas atribuições, as quais entram diversas vezes em colisão, levando à necessidade de exercícios ponderativos por parte do aplicador administrativo, a fim de garantir que este fim é prosseguido da forma mais adequada.
Neste caso o exercício ponderativo levou a que o dito fim fosse prosseguido da forma menos adequada possível. Como justificamos esta afirmação? Simples, através da despesa que o Município teve ao transferir verbas a fim de importar material, a grande despesa com os salários mensais de uma equipa de 30 cabeleireiros, ao longo de quatro anos... é óbvio que esta atuação teve um impacto significativo nas contas do Município. Esta grande despesa, sem um retorno satisfatório (1000$), agravou a sua capacidade de resposta aos eventuais problemas que possam surgir no presento e no futuro. Obviamente que não é do interesse da população ver a capacidade de resposta do Município fragilizada, devido a escolhas ilícitas, bem como a diminuição da capacidade de investimento em setores que, a priori, trariam muito mais retorno ou seriam mais úteis à população se fosse feito um investimento legal, devidamente justificado e de forma ponderada.
Em Portugal, em média, o salário médio de um cabeleireiro é cerca de 15000$ anuais, ou seja, 1250$ por mês. Multiplicando estes valores por 30 profissionais ao longo de quase 4 anos de funções chegamos a valores que superam, largamente, 1.5 Milhões de Euros gastos, somente, em salários. Numa altura de crise e recessão económica agravada pelas Guerras, que têm vindo a surgir, é importante fomentar a economia local, da forma mais abrangente possível. Para ser feito este investimento foi dado aos demais comerciantes, incluindo outros cabeleireiros, do Município uma mão cheia de nada.
Uma questão importante é saber quem define o interesse público. Será o aplicador? A resposta é negativa, quem define o interesse público é a lei e define-o para fins de aplicação em situações/casos concretos, mas também para diversas situações gerais e abstratas quando a administração exerce uma competência de emissão de regulamentos. Neste caso o interesse público foi definido de forma arbitrária pelo órgão executivo colegial.
Não encontramos nenhuma lei habilitante, que sustente a tomadas destas decisões.
Também não está consagrado nenhum conceito jurídico indeterminado que possa ser
eventualmente preenchido, atribuindo uma grande margem de decisão/discricionariedade
ao decisor administrativo, permitindo a justificação da tomada destas medidas. É notória
a violação de dois princípios fundamentais/estruturantes do Direito Administrativo,
consagrados no disposto doa artigos 3 e 4 do CPA (persecução do interesse público;
legalidade), sem ainda ter sido desenvolvida a temática do porquê da ilicitude dos atos
praticados.
Da inconstitucionalidade da decisão do município, de instalar um salão de
cabeleireiro na antiga loja municipal. Descrição do Procedimento que devia
ter sido seguido para a generalidade dos atos praticados.
Os Municípios são pessoas coletivas públicas de cariz territorial, defendendo os interesses locais da comunidade. Não obstante, o Município de Linha ter uma grande liberdade de manobra nas suas atribuições e não estar limitado por uma listagem taxativa de atribuições, existem regras que são efetivamente taxativas e que foram violados pelo órgão executivo colegial (Presidente e vereadores).
Primeiramente, existe um procedimento administrativo que tem de ser respeitado. O
procedimento administrativo é a sequência juridicamente ordenada de atos e
formalidades, respeitando prazos, tendentes à preparação e exteriorização da prática de
um ato, último e desejado, da administração ou à sua execução. O mesmo foi ignorado
ilicitamente em dois momentos distintos.
Este procedimento, se tivesse sido realizado, estaria incluído na categoria dos Procedimentos de Iniciativa Pública Comuns, pois seria a administração quem, a priori, tomaria a iniciativa de o desencadear e está regulado no próprio CPA. Também, tendo em atenção o critério do objeto, seria um procedimento decisório, pois tinha o objetivo de preparar um ato da Administração (não seria Executivo, pois não visaria executar um ato da Administração).
Fase Inicial: Desencadeia o procedimento administrativo, podendo surgir de iniciativa
pública ou privada (se for particular artigo 53 CPA). Como a Administração é que tinha
interesse em desencadear este processo, devia tê-lo comunicado à Associação dos
Cabeleireiros de Linha, bem como aos cidadãos do município, pois os seus direitos e
interesses legalmente protegidos foram manifestamente lesados, com a criação do Salão.
Fase de Instrução: destina-se a averiguar os factos que interessem à decisão final (artigos
115 a 120 CPA) e que se rege pelo princípio do inquisitório. Ou seja, a administração
pública, sem a dependência da vontade dos interessados, requer factos e esclarecimentos
que mais facilmente levem á tomada da melhor decisão, nos termos do disposto no artigo
58 do CPA. A direção do procedimento cabe ao executivo da Câmara Municipal, pois é o
órgão competente para a decisão final (concessão da utilização e exploração do domínio
público).
Fase da Audiência dos Interessados: é nesta fase (artigos 121 a 125 do CPA) que se
inserem os princípios da colaboração da Administração com os particulares (artigo 111
do CPA) e da participação (artigo 12), tendo a Audiência dos Interessados dignidade
Constitucional artigo 267/5 CRP ou para os mais céticos, consagrada na parte final do
disposto do artigo 2 CRP. Os interessados deviam ter sido ouvidos no procedimento, antes
de ser tomada a decisão final, esta poderia ter forma oral ou escrita, cabendo a escolha ao
diretor do procedimento no exercício do seu poder discricionário consagrado no disposto
do artigo 122/1 CPA. A falta de audiência prévia dos interessados, tem como
consequência a nulidade do ato, nos termos do disposto do artigo 161/2/d) do CPA, pois
é um direito fundamental dos particulares. (situações de dispensa 124 CPA).
Fase da preparação da decisão: A administração devia ter ponderado o quadro traçado na fase inicial, a prova recolhida na fase de instrução e os argumentos apresentados pelos particulares na fase da audiência dos interessados. Posteriormente seria levado ao órgão colegial que emitiria uma deliberação, nos termos dos artigos 125 e 126 do CPA.
Fase de Decisão: Põe fim a todo o procedimento administrativo, tal como a qualquer
facto do CPA que o acompanhe (artigo 93 CPA). O Procedimento pode termina pela
prática de um ato administrativo ou pela celebração de um contrato (artigo 126 CPA),
salvo disposição em contrário. Esta situação teria terminado pela prática de um ato
administrativo, e todas as questões pertinentes que não tiveram a hipótese de serem
colocadas, deviam ser alvo de resolução pelo órgão competente, como dispõe o artigo
94/1 do CPA.
Classificação do Ato Administrativo: Chama-se "deliberação", pois provém de um órgão colegial. A matéria de facto aponta para a integração da deliberação na categoria dos atos Permissivos, pois possibilitou a adoção de uma conduta, por parte da empresa púbica, que de outro modo lhe estaria vedada. Foi um ato que ampliou uma vantagem, neste caso uma Concessão, pois a Administração transferiu para a empresa pública o exercício de uma atividade pública. Por sua vez o concessionário devia ter desempenhado a atividade por sua conta e risco, mas tendo sempre presente o interesse geral da comunidade, mas em vez disso, viu todos os seus encargos serem cobertos pela Câmara Municipal.
É verdade que é o executivo da Câmara Municipal tem competência para proceder à concessão da utilização e exploração do domínio público. Contudo, esta cedência obriga, igualmente, à fixação dos critérios para o pagamento de taxas pelo concessionário, semelhante a um contrato de arrendamento, tendo o ato administrativo conteúdo de Direito Privado. Esta norma é claramente taxativa e foi desrespeitada pelo Município (artigo 32 da Lei n.º 31/2014, de 30 de maio). A cedência em causa foi feita a título gratuito, uma manifesta violação da lei em vigor.
A deliberação em análise comporta múltiplos vícios, as mais relevantes são as constantes preterições de formalidades anteriores à prática do ato. Face à violação do Direito de Audiência Prévia (vício de forma), que tem consagração expressa na Constituição, e segundo alguns autores é considerado um Direito Fundamental, classificamos a atuação como inconstitucionalidade e a consequência jurídica é, inquestionavelmente, a nulidade consagrada no disposto do artigo 161/2/d) do CPA.
Outra das formalidades essenciais alicerçadas ao ato administrativo é a fundamentação do mesmo. Este caso inclui-se no disposto no artigo 152/1/a) do CPA, logo há um dever de fundamentação, reforçado pelo disposto no artigo 268/3 CRP, que foi manifestamente violado pelo órgão executivo colegial. A mesma, como é disposto no artigo 153/2 CPA (ad contrarium) deve ser clara, coerente e completa. É uma ilegalidade formal, mas desta vez não tem consagração na Constituição, como Direito Fundamental.
A deliberação em causa contém outra ilegalidade, pois não houve respeito pelos elementos acessórios incluídos pela administração no conteúdo do ato (cedência gratuita do espaço, quando devia ser onerosa).
Da ilegalidade da transferência de verbas monetárias para a empresa pública
a fim de ser adquirido material antivírus e garantidos os salários dos 30
cabeleireiros.
Classificamos quanto ao tipo, o ato Administrativo como um Ato Constitutivo, pois
produz efeitos inovadores. Tanto a empresa pública como a empresa privada, depois da
prática do ato, encontram-se numa posição jurídica diferente daquela que detinham antes
da emanação do dito. Com esta deliberação [161/2/h) CPA], o órgão executivo colegial
tinha o propósito de modificar o estado material do Direito. Quanto ao conteúdo do ato,
acreditamos que seja um ato com conteúdo de Direito Administrativo.
O ato em análise carece de vícios, pois o princípio orçamental vigora na Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, que consagra o regime jurídico das Autarquias Locais. Cabe à Assembleia Municipal aprovar a proposta orçamental e suas alterações [artigo 25/1/a)]. Não existem atas que publicitem a consagração desta despesa no orçamento municipal, aprovado antes da situação pandémica afetar Portugal, a menos que a defesa as apresente... devemos assumir que foi um ato unilateral do órgão executivo colegial que extravasa as suas competências legalmente consagradas. Muito menos existem propostas do órgão executivo à Assembleia que visem consagrar no Orçamento, a transferência de verbas para a empresa pública a fim de ser adquirido material antivírus, na altura em que a pandemia atingiu Portugal.
Devemos evidenciar que o problema não se esgotou nesta situação. A Câmara Municipal,
através da Empresa Pública "Linha Mais Próxima" transferiu verbas monetárias a fim dos
salários, dos 30 cabeleireiros da empresa "Revivre Paris Ailleurs", serem pagos durante
quase 4 anos. Sendo que a Assembleia Municipal é o órgão que melhor representa a
comunidade, eleita por sufrágio universal direto, e tendo a competência para aprovar a
proposta do orçamento, estamos perante um caso de incompetência absoluta do órgão que
praticou o ato administrativo.
A única explicação, minimamente plausível, que se consegue encontrar para a prática deste ato/deliberação é, certamente, o facto do Presidente e vereadores terem dotes telepáticos e conseguirem captar a vontade coletiva da comunidade, melhor que uma Assembleia Municipal democraticamente eleita.
Em suma, é o caso claríssimo de usurpação de poder, pois foi praticado um ato pelo órgão administrativo que se incluí nas atribuições do poder legislativo. A execução da deliberação competia ao órgão executivo colegial, mas não a tomada da decisão em si. Viola, simultaneamente, a lei pois não existe lei que autorize a prática do ato descrito.
Da ilegalidade da compra e venda do material antivírus pela empresa
pública.
O principal objetivo do setor Público Empresarial é satisfazer as necessidades da
coletividade, porém deve ser sempre assegurado que o seu desenvolvimento segue
parâmetros de qualidade, eficiência e eficácia, contribuindo para um equilíbrio
económico. O seu regime está consagrado no disposto do Decreto-Lei 133/2013 de 3 de
outubro. Devemos realçar que o decreto lei consagra a função acionista ao serviço do
controlo financeiro e monitorização da empresa, bem como contenção da despesa.
Não interessa agora definir se a empresa é pública ou participada. Em ambos os casos, funcionam segundo a lógica do mercado, ou seja, dedicam-se à produção de determinados bens ou serviços, destinados a ser vendidos no mercado mediante um preço prosseguindo fins lucrativos. Não nos parece lícito, portanto, levar a cabo uma venda de equipamento caro por um valor simbólico. Agravada a situação pelo facto da empresa ter por, por definição, capitais públicos, sendo o seu património público, bem como seu financiamento que já concluímos não estar orçamentado, mas devia estar.
O artigo 15 do DL 133/2013 dispõe que o seu principal objetivo é a contribuição para o equilíbrio económico-financeiro do setor público e para a obtenção de níveis adequados de satisfação das necessidades coletivas. Estabelecendo igualmente uma neutralidade competitiva que foi manifestamente desrespeitada, face aos demais cabeleireiros do município de Linha, que foram prejudicados pelo facto desta empresa ser ilicitamente favorecida pela Câmara Municipal.
A compra do material não é lícita pois o capital que permitiu efetuar a compra foi
transferido para as contas da empresa ilicitamente, sendo o ato anulável nos termos do
disposto no artigo 163/1 CPA. A venda do material por um valor simbólico também não
é lícita, pois estamos perante um ato do tipo constitutivo, com conteúdo de direito privado
que carece de vícios.
Destacamos o desvio de poder por motivos de interesse privado. Existe uma grande margem de discricionariedade que permite uma atuação dinâmica das empresas públicas, mas já sabemos qual o fim que levou a lei a conferir este poder à empresa pública (a satisfação das necessidades coletivas da população). O que verificamos é que existe uma grande discrepância entre o fim legal e o fim prosseguido.
Os motivos ligados com a venda do material por um valor simbólico permanecem um
mistério, não obstante, esta atuação não é compatível com o fim legal da empresa, que
deve ser, igualmente, apresentar lucro, se não o fizer pelo menos terá de ter uma atuação
conforme à persecução desse fim.
Da ilegalidade da alienação do salão, sem qualquer formalidade.
Classificação do ato administrativo: Ato constitutivo proveniente de um único órgão administrativo e tem conteúdo de Direito Privado, pois consagra a venda de um bem imóvel.
Esta decisão, da empresa pública, com conluio do Município (pessoa coletiva pública de
cariz territorial), viola manifestamente as competências da dita empresa e o princípio da
persecução do interesse público consagrado no disposto do artigo 4 da Lei das Autarquias
Locais (Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro).
Não é a empresa pública que tem poder de alienar o bem imóvel, uma vez que este estava
apenas (ilicitamente) cedido. Essa competência cabe à Câmara Municipal que apenas
ratificou esta decisão ilícita [artigo 33/1/g) da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro].
O valor pelo qual o bem foi alienado é, igualmente, uma clara violação do princípio supramencionado, pois em época de crise económica, agravada pela COVID-19, não pode o órgão executivo do Município ratificar, mesmo que a ratificação não produza efeitos jurídicos, vendas de ou imóveis, por valores simbólicos.
Toda esta situação infeliz pode ser descrita como dar uma mão cheia de nada à população, através do salão de cabeleireiro em tempo de crise sanitária e financeira, e agravar as contas municipais enquanto tomam estas medidas prejudiciais; situação agravada pela falta de competência de quem procedeu à venda do dito bem.
Vícios e Regime de Invalidade do ato: Caso de incompetência absoluta, a empresa praticou atos que se inserem nas atribuições da Câmara Municipal
Da ilegalidade da contratação e do pagamento de salários dos cabeleireiros
da empresa "Revivre Paris Ailleurs" – desrespeito das normas de contratação
pública e possível cenário de concorrência desleal.
Segundo as regras definidas no Código dos Contratos Públicos (CCP), as câmaras municipais estão sujeitas às regras de contratação pública, que normalmente exigem a realização de um concurso público para contratar empresas para realizar serviços ou fornecer bens. O CCP estabelece todos os procedimentos a serem seguidos pelas entidades públicas ao realizar contratações.
O artigo 20 do CCP estabelece a obrigatoriedade de abertura de um concurso público
para contratação pela câmara municipal. Nos termos deste artigo, para a celebração de
contratos de locação ou de aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços, pode
adotar-se um concurso público ou concurso limitado por prévia qualificação, com ou sem
publicação de anúncio no Jornal Oficial da União Europeia; consulta prévia (com convite
a pelo menos três entidades) quando o valor do contrato seja inferior a 75000 euros; ou
ajuste direto, quando o valor do contrato for inferior 20000.
Segundo o artigo 112 n2 CCP, o ajuste direto é o procedimento em que a entidade
adjudicante convida diretamente uma entidade à sua escolha a apresentar proposta. Por
outras palavras, o ajuste direto é um procedimento fechado, contrariando um pouco a
lógica do concurso público. Neste procedimento, só podem apresentar propostas aqueles
que forem convidados a fazê-lo. Todavia, os critérios que permitem enveredar por este
procedimento são mais apertados, pois normalmente este procedimento é usado para
contratos muito mais baratos do que aqueles contratos que estão sujeitos a concurso
público. No entanto, ao abrigo dos artigos 24, 26 e 27 CCP, tal mencionado pelo perito,
a câmara municipal não pode adotar o ajuste direto – ou seja, não cumpriu nenhuma das
regras procedimentais do artigo 20 CCP.
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, o caráter de gestão pública convoca um dos mais complexos problemas da teoria do contrato administrativo, o da sua eventual distinção em face dos contratos de direito privado da administração.
Princípio da igualdade: Um artigo essencial da CRP, aplicável à atividade administrativa pública; impõe o tratamento igualitário de todos os interessados na adjudicação de um contrato público que se encontrem em condições objetivamente idênticas relativamente à capacidade de execução das prestações contratuais.
Princípio da concorrência: Recomenda que todas as disposições aplicáveis à
contratação pública sejam interpretadas e aplicadas no sentido mais favorável à
participação nos procedimentos pré-contratuais do maior número de interessados,
evitando-se exclusões por motivos meramente formais.
Princípio de transparência: Exige que as decisões tomadas pelos condutores dos
procedimentos pré-contratuais sejam explicitadas e devidamente fundamentadas, de
modo a seguirem como lógicas, racionais e tanto quanto possível, incontroversas, para
todos os intervenientes. O artigo 315 CCP fala do princípio numa obrigação de
transparência, que a lei faz impender sobre o contraente público.
Princípio da boa-fé: Considerando que os artigos 76, 79 e 105 CCP definem o
principal corolário do princípio no que se refere à contratação pública.
Princípio da colaboração recíproca: artigo 289: Dita aos contraentes o dever de se
informarem mutuamente sobretudo quanto revele no âmbito da execução contrato.
Princípio da conexão material e da proporcionalidade das prestações contratuais:
Este preceito, revogado pelo CCP, ditava a impossibilidade de o contraente público impor
ao aos contraentes prestações desprovidas de ligação ao objeto do contrato ou que se
revelassem desproporcionais. O artigo 281 CCP, que lhe sucedeu, demonstra uma
resposta mais equilibrada às preocupações do legislador. O contraente público não pode
assumir direitos manifestamente desproporcionados ou que não tenham uma conexão
material direta com o fim do contrato. A ideia da proporcionalidade está presente no artigo
303 n2 CCP, onde dispõe, a propósito dos poderes de direção e fiscalização do
contraente público, que estes devem salvaguardar a autonomia do co contraente,
limitando-se ao estritamente necessário à prossecução do interesse público, e no artigo
283 n4 CCP, em matéria da invalidade do contrato.
Com isto, é clara a violação dos procedimentos administrativos. Nenhuma das opções administrativas foi seguida, e a única que poderia ter sito (ajuste direto), não se enquadra nesta situação. Também é evidente a violação dos princípios constitucionais, e o fraco cumprimento legislativo.
O decreto-lei número 10-A/2020, de 13 de março, que apresenta medidas de contratação
pública excecionais e temporárias à situação do Covid-19, não se enquadra no caso em
questão. Este Decreto-Lei permite a celebração de contratos na sequência de ajuste direto
em situações de emergência. Porém, um cabeleireiro não é um estabelecimento
emergente, mas um exemplo deste seria, sim, um centro de saúde ou um estabelecimento
para os efeitos de vacinação.
Da violação do princípio da imparcialidade pelo vereador da Câmara
Municipal, responsável pela gestão da empresa pública.
Ora, para além dos princípios mencionados anteriormente pelos meus colegas, julgamos
também que o vereador representa um atentado à imparcialidade que se exige de um
indivíduo possuidor de um cargo público, na qual se depositou a confiança de zelar pelas
instituições democráticas. Esta ideia se imparcialidade é não apenas uma exigência legal
e regulamentar, é uma exigência constitucional, é um dos alicerces do Estado de Direito
Democrático que todos respeitamos e ao qual devemos toda a lealdade e compromisso.
DE REITERAR O ART.266 DA CRP E O ART 9 DO CPA QUE SUSTENTAM ESTA
IDEIA.
Ao acumular os cargos de vereador e de gestor da empresa pública em causa, o vereador não só quebrou a promessa de isenção que terá logicamente feito no momento em que tomou posse como eleito local, como terá utilizado essa parcialidade de uma forma altamente condenável. Relembro ao vereador que, ao aceitar o cargo, se comprometeu com os seguintes princípios (e isto claramente e objetivamente plasmado no ART 4º DA LEI 29/87 DE 30 DE JUNHO):
1) Observar escrupulosamente as normas legais e regulamentares aplicáveis aos atos
por si praticados ou pelos órgãos a que pertencem;
2) Cumprir e fazer cumprir as normas constitucionais e legais relativas à defesa dos interesses e direitos dos cidadãos no âmbito das suas competências;
3) Atuar com justiça e imparcialidade;
4) Em matéria de prossecução do interesse público: Salvaguardar e defender os interesses públicos do Estado e da respetiva autarquia; respeitar o fim público dos poderes em que se encontram investidos; não patrocinar interesses particulares, próprios ou de terceiros, de qualquer natureza, quer no exercício das suas funções, quer invocando a qualidade de membro de órgão autárquico; não intervir em processo administrativo, ato ou contrato de direito público ou privado, nem participar na apresentação, discussão ou votação de assuntos em que tenha interesse ou intervenção, por si ou como representante ou gestor de negócios de outra pessoa, ou em que tenha interesse ou intervenção em idênticas qualidades o seu cônjuge, parente ou afim em linha reta ou até ao 2.º grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem viva em economia comum; não celebrar com a autarquia qualquer contrato, salvo de adesão; não usar, para fins de interesse próprio ou de terceiros, informações a que tenha acesso no exercício das suas funções.
Podemos concluir com alguma facilidade que o vereador terá onerado arbitrariamente interesses legítimos dos administrados. Dados os factos, não só a atuação do sujeito enquanto vereador é duvidosa, como são também duvidosos os negócios celebrados aquando a acumulação destes cargos claramente incompatíveis e os seus efeitos.
Uma das formalidades essenciais (requisito de validade) alicerçadas ao ato administrativo é a fundamentação do mesmo, nos casos designados no artigo 152/1 do CPA e 268/3 CRP. O disposto no artigo 152/1/a) do CPA clarifica que os atos em análises não dispensam este dever de fundamentação, pois são suscetíveis de afetar os interesses legalmente protegidos dos cidadãos, tais decisões.
Este dever desempenha importantes funções quanto ao controlo da administração que está obrigada a explicar o porquê das suas decisões, logo estará forçada/impelida a ponderar de forma mais cautelosa, as suas decisões. Também tem uma dupla função a fim de garantir a proteção dos particulares, bem como aumentar a sua confiança na administração, uma vez que esta lhes fornece uma justificação dos seus atos.
Para a fundamentação se considerar efetuada, tem de obedecer aos requisitos previstos no artigo 153/1 CPA (expressa; expor os fundamentos de facto e de direito da decisão) e no artigo 153/2 CPA ad contrarium (clara, coerente e completa).
Quando o órgão executivo colegial se pronunciou apresentou uma justificação insuficiente, não fundamentada e incompleta. Não foi, e forma expressa, exposta a matéria de Direito que justifica as decisões e serve como um limite à atuação da administração (princípio da legalidade e da sujeição á lei). O mesmo pode ser estendido à justificação apresentada pela Empresa Pública, quanto aos atos praticados, e acrescenta-se que a coerência com a finalidade da persecução da obtenção de lucro, pela Empresa Pública (artigo 15 do DL 133/2013).
Afonso Banazol
Carolina Bleck
César Lenzi
Edgar Rodrigues
Leonor Lines Ferreira
Lídia Costa
Patrícia Motta Veiga
Rodrigo Bernardino
Vasco dos Reis e Silva